Ana Terra era uma moça que morava com sua família em um sítio
muito longe da cidade e tinha uma vida sofrida, e a única coisa
que Ana e sua família faziam era trabalhar. Embora Ana tinha o
desejo de abraçar e beijar algum homem.
O princípio de seu desejo veio com a chegada do índio Pedro
O princípio de seu desejo veio com a chegada do índio Pedro
Missioneiro, e que lentamente foi crescendo na sua condição de
macho: uma cara moça e trigueira, de maçãs salientes. Ana,
quando o via sentia uma coisa que não podia explicar: um
mal-estar sem nome, mistura de acanhamento, nojo e fascinação.
Em sua singeleza, atraía-se pelo estranho, confirmando-se como
Em sua singeleza, atraía-se pelo estranho, confirmando-se como
aquela mulher desejável que enxergara no fundo das águas.
Entregar-se àquele desconhecido foi um passo tão natural como
o suceder das estações naqueles ermos.
Antes, arriscou um jogo delicioso de avanços e recuos, sabendo
Antes, arriscou um jogo delicioso de avanços e recuos, sabendo
que, quisesse ou não quisesse, agindo a favor ou contra a lei paterna,
seria daquele homem. E, numa tarde, considerou-se pronta, e o
desejo palpitava em todas as sua artérias; encaminhou-se para a
barraca do índio, o reino de Pedro Missioneiro. E lá aconteceu
algo que Ana queria.
Os dias seguintes foram de medo, pânico misturado à vergonha e
Os dias seguintes foram de medo, pânico misturado à vergonha e
depois disso, logo soube que estava grávida, e o isso tornou-se um
espaço de lágrimas. Carregou o segredo o quanto pôde, mas um dia,
não se contendo mais, revelou tudo à mãe. Dona Henriqueta nem
teve tempo de consolá-la: e o pai declarou já saber de tudo e foi
como se um trovão cortasse os céus. Nada mais poderia ser feito:
cumprindo um código ancestral, ele convocou os dois filhos, e
esses mataram Pedro Missioneiro. Sabia que sua vida naquela
casa dali por diante seria um inferno.
De um instante para outro tornou-se invisível aos olhos do Pai,
De um instante para outro tornou-se invisível aos olhos do Pai,
transfigurando-se numa entidade pecadora. Simbolicamente
expulsa de sua casa, procurou fazer-se pequena, para que sua
pequenez diminuísse a dor da culpa; tratava-se, porém, de uma
culpa mais aceita do que entendida. Logo aconteceu o nascimento
do filho de Ana Terra e, Dona Henriqueta assistiu-a, cortando o
cordão umbilical do menino Pedro.
Mesmo assim, os pais e irmãos não tomaram conhecimento do
Mesmo assim, os pais e irmãos não tomaram conhecimento do
novo ser que habitaria o rancho. Contra toda as possibilidades,
Pedrinho cresceu, e a vida seguiu seu rumo. Os irmãos casaram-se,
e, para Ana, cada dia era a repetição do dia anterior.
Depois disso, sua mãe morreu, de nó nas tripas, mas esta morte
Depois disso, sua mãe morreu, de nó nas tripas, mas esta morte
não abalou muito à Ana. Então vieram vários castelhanos,
assassinando, incendiando, violando. Ana mandou a esposa de seu
irmão e as duas crianças irem se esconder no mato, e fingindo ser
a única mulher da casa, imola-se voluntariamente à sanha dos bandidos.
Foi estuprada várias vezes, e ao acordar de seu desfalecimento,
encontrou um quadro de horrores: o pai, o irmão Antônio, os escravos,
todos estavam mortos no meio da casa já destruída.
Ana entendia naquele momento que estava liberta de sua mancha
Ana entendia naquele momento que estava liberta de sua mancha
original, e pela forma mais bárbara e purificadora. Nada lhe fora
poupado em sofrimento, e pelo sofrimento reconciliava-se com a vida.
Numa exaltação próxima a uma feroz alegria, aceitou o convite de
um forasteiro para ir formar o núcleo inicial de uma nova vida, e
uma longa viagem a levou para um planalto. Lá ela construiu uma casa,
morando com seu filho, que logo teve que ir para uma guerra contra os
castelhanos. Voltando da guerra vivo, casou-se com uma moça, teve
um filho e logo teve que voltar para a guerra, com o compromisso de
voltar vivo, pois agora ele tinha uma mulher e um filho para cuidar.
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