Páginas

sábado, 13 de janeiro de 2018

RESUMO DO LIVRO "NO MOINHO"




Análise crítica

O conto “No Moinho” de Eça de Queirós traz como personagem principal, 
Maria da Piedade que “era considerada em toda a vila como uma senhora 
modelo” que dava orgulho à vila por “sua beleza delicada e tocante; era 
loura, de perfil fino, a pele ebúrnea, e os olhos escuros”, enfim, era 
considerada “uma fada”. Essa descrição denota a opinião da sociedade 
sobre a personagem e todas as características reforçam o ideal romântico 
de mulher apresentado logo no início da narrativa.

De família modesta, mãe “desagradável” e pai bêbado, Maria da Piedade 
vê como única saída casar-se com João Coutinho, um homem doente, 
mas rico, com quem teve três filhos, duas meninas e um menino que 
por herança genética todos nasceram doentes. Assim, restava-lhe viver 
como enfermeira, cuidando das doenças do marido e dos filhos. 
Como consequência sua vida é sombria, pois está sempre “vestida de
 preto” e sua casa parece “lúgubre”.

Então, João Coutinho recebe uma carta de quem tinha orgulho, seu 
primo Adrião, romancista de Lisboa, anunciando sua chegada para 
a venda de uma propriedade rural.
Imediatamente João manda providenciar estadia para o primo e isso 
deixa Maria da Piedade apavorada por ter em casa um estranho que 
quebraria a rotina da residência, porém o primo chega e deseja ficar 
na estalagem de Tio André para não perturbar a ordem da casa de 
Coutinho.

Adrião desejava vendar uma fazenda, mas não encontrava comprador, 
então, João Coutinho ofereceu Maria Piedade para ir com ele à fazenda, 
pois era boa conselheira e entendia dessas coisas. O primo, então, 
comentou: um anjo que entende de cifras. E, pela primeira vez, Maria 
Piedade se sentiu valorizada com o dizer de um homem, pois “corou” 
com as palavras de Adrião. É nesse momento que ela começa a enxergar 
o primo com os olhos da alma.

No dia seguinte, encaminharam-se à fazenda e o narrador descreve o dia 
como “fresco e claro”, características que traduzem tranquilidade e 
metaforiza o paraíso que antes era inexistente, por ser lúgubre e cheio 
de trevas.

Decidiram, posteriormente, ir ao moinho para que Adrião conhecesse. 
“Já viu o moinho? – perguntou-lhe ela. Tenho vontade de o ver, se mo 
quiser mostrar, prima.” Essa parte do diálogo mostra que os dois já se 
sentiam atraídos e pouco faltava para que essa atração os unisse. 
Nesse dia, Adrião vai para a estalagem e percebe que está “interessado 
por aquela criatura tão triste e doce”, diferente das demais mulheres que 
ele conhecera, já que era um homem desejado por todas.

Ao descrever a mulher desejada, Adrião demonstra o conhecimento que 
tem da alma feminina, adquirido com seu último livro, Madalena, pois a 
obra exigiu “um estudo de mulher trabalhado a grande estilo, duma análise 
delicada e sutil” que o consagrou como mestre na análise da mulher. 
Após observar aquela que ele chamava de anjo, pôde concluir que ela era 
presa àquele lugar, à tradição e “bastaria um sopro para o fazer remontar 
ao céu natural, aos cimos puros da sentimentalidade”. 
Nesse trecho é possível perceber o que Adrião já planejava acontecer nos 
próximos dias.

Como combinado, foram ao moinho e cansada da caminhada, Maria da 
Piedade senta-se numa pedra e Adrião começa a comparar o moinho com 
o paraíso e a imaginar como seria se eles para sempre ficassem ali. 
Então, ela fica corada e ri. Mas, de repente, ele a abraça e a beija profundo 
e interminavelmente, colocando-a contra seu peito, “branca, como morta”. 
A palavra morta nesse trecho é usada de maneira dicotômica, representando 
a morte e a vida, pois até esse momento Maria da Piedade não vive para si e 
não é feliz, pois vive apenas para o marido e os filhos. 
Assim, Adrião com um beijo a desperta, como se fosse a Bela Adormecida, 
para a vida. Após beijá-la, ele fica contente com sua “generosidade” como 
se ele soubesse as possíveis consequências do beijo na prima, que se 
evidenciam no trecho onde ele afirma que “de resto um momento como 
aquele no moinho não voltaria. Seria absurdo ficar ali, naquele canto odioso 
da província, desmoralizando, a frio, uma boa mãe…”.

Maria da Piedade ao sentir e visualizar outras possibilidades para sua 
existência, além de ser enfermeira do marido e dos filhos, reflete sobre a vida 
que tem e começa a achar os seus “fardos injustos”, então, compreendemos 
que quando não se conhece outros “sabores”, resta o contentamento com o 
que se tem. A partir dessa conclusão a personagem começa a pensar em 
apressar a morte do marido e a deixar os filhos sujos e sem comida.

Injustiçada, restava-lhe o amor que sentia por Adrião e “refugiava-se então 
naquele amor como uma compensação deliciosa”, portanto, ela passara a 
sonhar, a imaginar aquele homem forte, extraordinário, belo como sendo a 
razão de sua vida, pois antes de conhecê-lo estava morta ao lado de um 
homem fraco e doente que era João Coutinho. Inclusive, é possível fazer 
uma comparação semântica entre o nome de Adrião que reflete 
expansividade, força, enquanto o de João Coutinho com o diminutivo o 
faz pequeno e fraco.

Amando Adrião, Maria da Piedade queria tudo “que era ou vinha dele”, 
por isso “leu todos os seus livros, sobretudo aquela Madalena que também 
amara e morrera dum abandono”, nesse momento ela se identifica com 
Madalena, pois amara e também fora abandonada por Adrião. 
E lendo, se acalmava e revidava a vida que vivia, pois pegava emprestado 
essa vivência quando chorava “as dores das heroínas de romance”, logo, 
“parecia sentir alívio às suas”.

Ela passou a sentir necessidade de ler romances constantemente, assim 
“criando no seu espírito um mundo artificial e idealizado”. 
É nesse momento que a personagem começa a idealizar, coisa que não 
fazia antes, também começam aparecer revoltas, ocasionadas pelas 
interrupções à suas leituras românticas.

“O seu amor desprendeu-se pouco a pouco da imagem de Adrião e 
alargou-se a um ser vago que era feito de tudo que a encantara nos heróis 
de novela”, Maria da Piedade queria ser amada, importante como mulher 
e possuída pelos homens aos moldes dos romances que lia, pois assim ela 
preencheria seu vazio com seus amantes que, em geral, eram fortes, o 
oposto da figura raquítica de seu marido.

“À noite abafava; abria a janela; mas o cálido ar, o bafo morno da terra 
aquecida do sol, enchiam-na dum desejo intenso, duma ânsia voluptuosa, 
cortada de crises de choro.” O momento noturno propiciava reflexão e 
solidão à Maria da Piedade que mesmo rodeada de amantes, terminava 
solitária e chorosa à noite. 
Então, no moinho, a figura de Santa se transforma em Vênus, deusa do 
amor responsável pelo prazer, pelo sexo e pela satisfação de maneira
inconsequente, sendo na Odisseia aquela que também trai.

É preciso reconhecer que Maria da Piedade desejou ser outra antes da 
sua transformação em Vênus, pois tinha “momentos em que desejasse 
alguma outra coisa além daquelas quatro paredes, impregnadas do bafo 
de doença…”, portanto, não se muda uma pessoa, apenas lhe mostra o 
caminho, as escolhas e Adrião lhe mostrou um mundo novo, cheio de 
opções além das enfermidades, a fez livre e por se tornar livre, acabou 
escandalizando “toda a vila” que tinha princípios morais opostos aos 
adotados por Vênus.

A traição ocorrida em “No moinho” tem uma mera semelhança com o 
romance, do mesmo autor, “O Primo Basílio”. 
No conto, Maria da Piedade mesmo tendo um marido, não tem um 
companheiro, pois este vive enfermo, assim como Luísa no romance, 
que tem um marido ausente. Ambas sofrem por essa condição e com a 
chegada dos primos Adrião e Basílio, respectivamente, a situação é 
intensificada, culminando no adultério. As duas mulheres, antes vistas 
como anjos, caem em traição e viram “Vênus”, sendo malvistas pela 
sociedade a que pertencem.

Ao abordar esse tema (adultério), Eça de Queirós pretende criticar a 
influência dos romances nas traições matrimoniais, fato bastante 
evidenciado no conto, onde o narrador afirma que “o romantismo 
mórbido tinha penetrado naquele ser, e desmoralizara-o tão 
profundamente, que chegou ao momento em que bastaria que um 
homem lhe tocasse, para ela lhe cair nos braços”. Devido a essa 
crítica ao idealismo romântico o conto se encaixa na perspectiva 
naturalista, pois o instinto prevalece à razão, por meio do espaço 
corrompido moralmente pela traição, assim, provando que o meio é 
capaz de influenciar o homem.

Nenhum comentário:

Postar um comentário